"Ouça o chanceler", aconselharia Getúlio a Bolsonaro, sugere Elio Gaspari. Militares brasileiros e Itamaraty estão em guerra

Em texto ficcional, como já o fez em outras oportunidades, colunista da Folha de S Paulo e de O Globo especula conselhos de Vargas ao governo brasileiro de hoje

"Ouça o chanceler", aconselharia Getúlio a Bolsonaro, sugere Elio Gaspari. Militares brasileiros e Itamaraty estão em guerra

Em texto ficcional, como já o fez em outras oportunidades, colunista da Folha de S Paulo e de O Globo especula conselhos de Vargas ao governo brasileiro de hoje

www.brasil247.com - (Foto: Alice Vergueiro/Abraji | Arquivo Nacional)

  

 

Por Luís Costa Pinto, do 247 – Há uma disputa já não mais silenciosa entre os militares que circulam em torno do Palácio do Planalto, de pijama ou ainda vestidos em coturnos, pelo controle da posição brasileira em relação à guerra iniciada pela Rússia de Vladimir Putin ao invadir e bombardear a Ucrânia. A burocracia profissional do Itamaraty, o Ministério das Relações Exteriores, retomou várias cabeças-de-ponte que haviam sido conquistadas por bolsonaristas e por adeptos do astrólogo Olavo de Carvalho nos primeiros anos do mandato de Jair Bolsonaro.

O então ministro Ernesto Araújo era o controlador dessa linha de transmissão do obscurantismo para dentro do MRE. Carlos França, que ocupou o lugar de Araújo, restabeleceu conexões e ascendências dos diplomatas profissionais e conseguiu impor de Estado do Itamaraty ao governo. Ao menos até aqui, porque os militares que orbitam em torno de Bolsonaro querem posições mais evidentemente pró-guerra e pró-Putin saídas do Palácio do Planalto. Apostam no conflito e no seu recrudescimento como forma de fortalecimento eleitoral da imagem de Bolsonaro.

Em artigo que escreve às 4ªs feiras para os jornais Folha de S Paulo e O Globo, o jornalista Elio Gaspari narra o que poderia ser um conselho de Getúlio Vargas, que esteve à frente do governo brasileiro, como ditador, durante a 2ª Guerra Mundial, a Jair Bolsonaro.

Gaspari diz que Vargas ouvia a todos, sobretudo os marechais Dutra e Monteiros, mas escutava mesmo Oswaldo Aranha

“Prezado presidente, o senhor não gosta de mim e a recíproca é verdadeira. Escrevo-lhe para sugerir alguma cautela diante da guerra europeia”, começa Gaspari. “Pretendo ater-me aos cuidados que tive entre agosto e setembro de 1941, quando a tropa alemã entrou em Kiev. Como o senhor sabe, Hitler invadiu a Rússia em junho num ataque fulminante e em agosto estava nas proximidades da capital da Ucrânia, a caminho de Moscou. Foi uma guerra diferente na forma e no conteúdo, mas vou lhe contar o que acontecia no palácio do Catete e outras coisas que eu só soube quando vim para cá”.
“A invasão da Rússia já tinha data marcada quando o presidente americano Franklin Roosevelt mandou ao Rio um escultor para fazer meu busto. Dois dos meus conselheiros, os generais Dutra (ministro da Guerra) e Góes Monteiro (chefe do Estado-Maior), achavam que a máquina alemã seria invencível na Rússia”, narra o colunista em seu texto, como se Vargas se dirigisse a Bolsonaro – os fatos históricos são verdadeiros, por óbvio.

 

E prossegue: “Nenhum de nós sabia que o secretário da Guerra, Henry Stimson, estava de olho no Brasil. Três dias antes da invasão da Rússia ele escreveu ao presidente, temendo que os alemães pulassem do Norte da África sobre o nosso território. (A menor distância para se atravessar o Atlântico Sul vai da costa africana ao Saliente Nordestino.) Lembro-lhe que os Estados Unidos não haviam entrado na guerra, mas ele queria "salvar o Brasil". Como? Instalando uma base no Nordeste”.

“Eu mandava sinais para os dois lados. Quando falei nos riscos do "capitalismo financeiro cosmopolita", o embaixador americano assustou-se. Já o alemão acreditava que o Brasil estava afastado dos Estados Unidos. Muita gente supunha que os russos estavam perdidos, imagine que chegaram a tirar múmia do Lenin de Moscou”, continua Elio Gaspari em seu texto.

“No final de setembro os alemães entraram em Kiev. Eu me aborrecia com a insistência dos americanos para construir bases aéreas e navais no Brasil, mas desde o primeiro momento alinhei-me com Roosevelt. Não me passava pela cabeça ficar contra os Estados Unidos, mas eles não estavam na guerra”, narra, para concluir: “Como o senhor sabe, o Japão atacou, liberei a construção da base de Natal e ela foi uma das principais pistas de pouso dos aviões americanos. Declarei guerra ao Eixo e, depois do desembarque Aliado na Europa, nossa Força Expedicionária chegou à Itália. Equilibrei-me. Tivesse ouvido o Góes, o Dutra e alguns conselheiros em 1941 e estaria frito.

Ouça o chanceler, eu ouvia o Aranha”.