NORTE DO GOVERNO QUE RECLAMA TEORIA DAS FINANÇAS FUNCIONAIS COMO OPÇÃO AO TRIPÉECONÔMICO NEOLIBERAL
SOCORRO AO RGS VIRA
NORTE DO GOVERNO QUE RECLAMA TEORIA DAS FINANÇAS FUNCIONAIS COMO OPÇÃO AO TRIPÉECONÔMICO NEOLIBERAL
CÉSAR FONSECA
O que, na verdade, o Governo Lula precisa para salvar o Rio Grande do Sul não está escrito nos livros textos de economia aplicados no Brasil pelos capitalistas dos países desenvolvidos, que têm como verdade ortodoxa o chamado tripé econômico neoliberal, que conjuga câmbio flutuante, superávit primário e metas inflacionárias.
Essa conjugação, imposta pelo Consenso de Washington, nos anos 1980 em diante, em vigor até hoje, deixou de ser funcional em face da emergência gaúcha produzida pela catástrofe ambiental.
O tripé tem como base teórica do capitalismo neoliberal – amplamente contestada no mundo, desde o momento em que os Estados Unidos romperam com o padrão-ouro, nos anos 1970, deixando a moeda flutuar – a máxima de que a inflação é fenômeno monetário.
Segundo pensamento neoliberal, a inflação decorre do excesso de liquidez monetária, razão pela qual se faz necessária taxa de juro sempre elevada para enxugar excesso de moeda em circulação, até que haja relação dívida pública-PIB, conveniente aos interesses do capitalismo financeiro especulativo, quando, então, segundo os banqueiros, haveria equilíbrio macroeconômico, capaz de permitir queda da taxa de juro.
Trata-se de uma construção econômica abstrata dos credores da dívida pública, jamais efetivada na prática, para esvaziar economicamente o papel do Estado na economia.
Essencialmente, o tripé econômico limita o Estado no seu papel de emitir moeda fora do quadrado monetarista fixado pelos credores.
Tal regra jamais foi cumprida pelos países capitalistas desenvolvidos, que a defendem para os países pobres em desenvolvimento descontinuado, por causa do seu excessivo endividamento, considerado risco perigoso para a banca.
LARA RESENDE ROMPE COM O TRIPÉ
A tese do tripé econômico neoliberal, implementada, no Brasil, a partir da Era FHC, depois que os tucanos adotaram a sobrevalorização cambial para derrubar hiperinflação, colhendo, como resultado, desindustrialização, achatamento salarial, desigualdade social e, consequentemente, redução dos investimentos, passou a ser contestada pelo economista André Lara Resende, ironicamente, um dos criadores do Plano Real fernandino, em 1994.
O teste decisivo, responsável por mudar opinião de Lara Resende, foi o crash de 2008, que levou à bancarrota grandes bancos americanos, salvos pela decisão do Banco Central americano de emitir sem limites moeda para trocar dívidas velhas por dívidas novas, equacionando balanços pobres da banca americana falida.
Essa trajetória começou logo depois do colapso do banco Lehman Brothers, até que a situação, que ainda não foi equacionada, totalmente, baixasse de intensidade, “normalizando” funcionamento do mercado financeiro internacional, levando-o à financeirização econômica global oligopolizada.
A ação do FED produziu nova realidade: jogou por terra a tese de que a inflação é um fenômeno monetário, como dizem os neoliberais, desde o século 19, adeptos do padrão ouro monetarista.
Não se verificou, em face do excesso de liquidez monetária produzido pelo FED, o que os teóricos dizem, ou seja, hiperinflação.
Pelo contrário, a inflação não explodiu porque com oferta excessiva de dinheiro na circulação capitalista, a taxa de juros deixou de ser positiva para ser negativa, anulando crescimento – ou melhor, estabilizando – da dívida pública.
TEORIA KEYNESIANA EM AÇÃO
Mais uma vez, Keynes acertou, com dezena de anos de antecedência, ao dizer, no seu famoso livro “Teoria Geral do Emprego, do Juro e da Moeda”, que a única variável econômica verdadeiramente independente no capitalismo é o aumento da quantidade da oferta de moeda pela autoridade monetária.
Quando o Estado – a autoridade monetária – age, nesse sentido, nos momentos de grave crise, simultaneamente, 1) reduz a taxa de juro, 2) diminui a unidade de salário nominal, 3) perdoa dívida contratada a prazo e 4) eleva o lucro dos empresários, elevando a eficiência marginal do capital.
O FED salvou o capitalismo americano do colapso, com a bancarrota do Lehman Brothers, ao evitar corrida aos bancos, que produziria monetização da dívida pública americana, levando a economia à hiperinflação exponencial.
André Lara Resende, adepto da nova Teoria das Finanças Funcionais, colocada em prática pelo FED, que diminuiu juros e inflação, graças à maior oferta de dinheiro em circulação, passou a pregar o que apavora o mercado financeiro especulativo: quando o governo emite sua própria moeda, não corre risco de produzir inflação, ao contrário do que aconteceria se tomasse empréstimo externo sobre o qual não tem controle efetivo, diante das flutuações monetárias.
LULA DIANTE DA NOVATEORIA MONETÁRIA
Lara Resende tornou-se “persona non grata” à Faria Lima, depois de escrever livro sobre o assunto, “Juros, Moeda e Ortodoxia”, como alternativa necessária à substituição do tripé econômico neoliberal, se o país quiser crescer sustentavelmente.
Esta possibilidade é simplesmente impossível no contexto neoliberal em que o governo é obrigado a submeter-se ao neoliberalismo financista – que leva ao fascismo, como mostrou o bolsonarismo.
Prisioneiro de metas inflacionárias, câmbio flutuante e superávit primário, impostos por ajustes fiscais incompatíveis com crescimento econômico sustentável, o governo Lula dificilmente superará a crise gaúcha, como já se encontra em dificuldade para implementar propostas desenvolvimentistas, como prometeu em campanha eleitoral, tendo sob seu costado o arcabouço neoliberal conduzido pelo Banco Central Independente, em aliança com o semipresidencialismo-
Diante de tragédias, como a catástrofe climática, que castiga o Rio Grande do Sul, terceira maior economia da Federação, a receita econômica que vem desde o Consenso de Washington, nos anos 1980, é, totalmente, inadequada.
A ortodoxia ultraneoliberal, acelerada pelo governo Bolsonaro, que deixou para Lula herança maldita de baixo crescimento do PIB, devido ao aumento da desigualdade social, a inibir investimentos, impede a estratégia desenvolvimentista, atropelada pela catástrofe gaúcha.
DILEMA LULISTA
O presidente, que, nesta segunda feira, reúne o governo para buscar solução para a crise emergencial gaúcha, tem diante de si o dilema: continuar com o tripé neoliberal, que não o deixa governar, já antes do colapso climático, ou elevar a quantidade da oferta de moeda estatal na circulação capitalista brasileira, sem ter medo, como defende Lara Resende, de perder o controle da inflação; afinal, emitirá reais, moeda nacional, e não tomar empréstimo externo diante de emergência extraordinária.
O arcabouço fiscal que o governo negociou com os bancos, cujas consequências condenam o país ao baixo e lento crescimento econômico, incapaz de produzir as soluções necessárias ao desenvolvimento sustentável, está, completamente, em xeque.
A ortodoxia monetária se mostra demasiado estreita para dar conta do desafio e joga o governo diante da opção econômica heterodoxa.
Esta se mostra necessária, para romper os impasses que a restrição monetária neoliberal impõe, a fim de privilegiar não ao social, mas ao financismo rentista especulativo, que domina a economia nacional por meio do tripé econômico neoliberal.
As circunstâncias levam o Planalto a considerar o que o economista André Lara Resende tem defendido – e por defender, encontra-se marginalizado pelo status quo: trata-se de mudar a própria teoria econômica vigente para abrir espaço àquela que os países desenvolvidos adotam, diante de catástrofes financeiras, a chamada Teoria das Finanças Funcionais, já que o tripé se tornou disfuncional.