UMA EPOPÉIA NÃO MERECE ANÁLISE

UMA EPOPÉIA NÃO MERECE ANÁLISE

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UMA EPOPÉIA NÃO MERECE ANÁLISE

"UMA EPOPÉIA NÃO MERECE ANÁLISE", Manoel de Barros

Por Luiz Carlos Prestes Filho

Não conhecia o "Coletivo de Galochas". Pude apreciar seu trabalho, através do espetáculo "A Coluna Prestes: Ecruzilhadas da Marcha Esperança", em São Paulo, no Teatro Arthur Azevedo. Momento quando fui surpreendido com seu profissionalismo.

Cena da peça teatral "Coluna Prestes - Ecruzilhadas da Marcha da Esperança" - foto Camila Rios e Diogo Gomes

O cenário do espetáculo mencionado é minimalista, formado por quatro estruturas móveis e uma fixa, na parte profunda do palco. A iluminação é bem objetiva, não tem grandes variações. O figurino e acessórios dos atores foram inventados para atender a representação das personagens. A banda musical, que fica em cena durante todo espetáculo, não sobrepõe a trilha sonora sob o desenrolar das cenas. Sempre está em harmonia com os diálogos, danças e monólogos.

O tema Coluna Prestes, para quem conhece esta passagem marcante da História do Brasil, pressupõe um discurso teatral revolucionário ou panfletário. Até porque os tenentes que lideraram a marcha que cruzou o Brasil, entre 1924 e 1927, eram na sua maioria jovens. Meu pai, por exemplo, que liderou os 1.500 combatentes, tinha 26 anos, quando enfrentou os primeiros combates. Lutando pela industrialização do país, voto secreto, voto feminino, fim da corrupção, liberdade de expressão, modernização do exército e reformas sociais profundas.

Luiz Carlos Prestes Filho conversa com o dramaturgo, diretor, produtora e o elenco da peça "Coluna Prestes - Ecruzilhadas da Marcha Esperança" - foto Regiane Philadelpho 


O discurso revolucionário de 100 anos atrás, sim, está em cena, ele não foi abandonado pelo "Coletivo de Galochas", mas é fundamental destacar que este foi atualizado. As pautas de hoje como meio ambiente, identidade étnica, feminismo, liberdade e valorização de todas manifestações religiosas envolve os espectadores. As personagens femininas tem o mesmo destaque que o comandante Luiz Carlos Prestes. Assim como uma travesti que domina armas como os mais corajosos combatentes.

Luiz Carlos Prestes Filho e o elenco, produtora, diretor e dramatugo da peça "Coluna Prestes - Ecruzilhadas da Marcha da Esperança" - foto Regiane Philadelpho 

Foi muito positiva a decisão  de não buscar a exata representação dos fatos e das datas, tão valorizadas nos livros sobre a Coluna Prestes. Desta maneira o dramaturgo, o diretor e os atores tiveram total liberdade para impor uma visão inovadora. Conseguiram fugir dos rótulos e formas. Em especial da análise daquele acontecimento. Na peça, não existe análise. Existe amor, paixão, coragem destemida, morte, nascimento de uma criança, perigos, travessias e sonhos. O espetáculo me fez lembrar uma carta que recebi do querido amigo Manoel de Barros, o poeta do Pantanal. Em 1995 eu viajava pelas trilhas da Coluna Prestes. Com esta carta termino meu texto:

Campo Grande (MS) - 14 -7 - 95
Caro amigo Luiz Carlos,
Recebi sua carta vinda de Cuiabá. Obrigado pelas boas palavras. Faço votos que seu trabalho de resgate da Coluna (Prestes) caminhe bem. Só não gostei do seu amigo dizer que somente um historiador marxista poderia dar parecer razoável sobre as trilhas da Coluna (Prestes). Seu amigo não pensa no épico? Na epopeia? Na bravura quase poética da Marcha? O heroísmo não aguenta análise. É um desassombro poético. Vá para o inferno a análise marxista nisso.

O heroísmo não aguenta análise. É um desassombro poético. Vá para o inferno a análise marxista nisso.

A epopeia não merece análise. Merece canto, exaltação, louvação. Tem de ser tratada em linguagem de Homero. Tem que lembrar Ulisses, etc. Seja um cantor do heroísmo em seu trabalho. E não um mero analista. Mesmo porque seu pai quando fez a marcha nem sabia do marxismo.  Aproxime-se das inscrições rupestres e dos minadouros humanos. Transmita imagens intrincadas sim. Tente uma epopeia e não uma análise. Tente a recriação de fatos heroicos e grandiosos. O resto não tem perenidade.

Abraço fraterno do Manoel de Barros

*Luiz Carlos Prestes Filho, diretor de filmes documentários, formado pelo Instituto Estatal de Cinema da União Soviética, é jornalista, compositor e escritor; especialista em Economia da Cultura e membro da diretoria do PEN Clube do Brasil - foto Regiane Philadelpho 



Serviço

"Espetáculo: Coluna Prestes: Encruzilhadas da Marcha da Esperança"
Estreia: 2 de junho de 2023 – Sexta, às 21h
Temporada: 2 a 25 de junho - Sexta e sábado (às 21h) e domingo (às 19h).
Ingressos: Gratuitos – Retirar na bilheteria 1h antes das sessões.
Duração: 100 minutos. Gênero: Drama. Classificação: 14 anos.

Sinopse: Brasil, década de 1920. A Coluna Prestes rasga o país. Durante a marcha, um grupo de oito pessoas, dos mais diferentes lugares, formam uma inusitada família, entrelaçando e mudando suas vidas. É com essa gente que Luiz Carlos Prestes aprende, forjando seu espírito revolucionário.

FICHA TÉCNICA – Direção: Rafael Presto. Dramaturgia: Antonio Herci e Rafael Presto. Direção musical, arranjos, regência e sonoplastia: Antonio Herci. Elenco / personagens: Benedita Maria de Jesus Bueno Dias (Isabel Pisca-Pisca), Daniel Lopes (Soldado Ângelo), Diego Henrique (Sargento Garcia), Eder dos Anjos (Cabo Firmino), Ivone Dias Gomes (Onça), Kleber Palmeira (Comandante Prestes), Mona Rikumbi (Tia Maria) e Wendy Villalobos (Santa Rosa). Coro Cênico: Luísa Borsari, Maria Kowales Aguirre, Matheus Kawa, Giovana Carneiro, Jota Silva, Leandro Duarte, Mateus Vicente, Nayra Priscila, Priscila Ribeiro, Silvia Lys, Tércio Moura e Victor Carriel. Musicistas/músicos: Antonio Herci (piano e sintetizadores), Jéssica Nunes (sanfona), Lula Gama (violão de 7 cordas), Miguel D’Antar (contrabaixo acústico) e Natália Lima (percussão e bateria). Cenografia, figurino e adereços: Kleber Montanheiro. Iluminação: Sueli Matsusaki e Marcos Feire. Coreografia: Letícia Doretto. Técnico de som: Gustavo Trivela. Provocação cênica: Júlio Silvério. Colaboração na criação: Nicolle Puzzi e Verônica Valentino. Audiovisual e vídeo mapeado: Diogo Gomes. Direção de produção: Gabriela Morato. Produção: Maura Cardoso. Gestão de redes sociais: Dora Scobar. Fotos: Camila Rios e Diogo Gomes. Designer Gráfico: Gustavo Oliveira. Assessoria de imprensa: Verbena Comunicação. Idealização e realização: Coletivo de Galochas.

 
Teatro Arthur Azevedo
Av. Paes de Barros, 955 - Alto da Mooca. São Paulo/SP.
Telefone: (11) 2604-5558. Na rede: @teatroarthurazevedosp