Primárias da oposição devem definir eleições na Argentina

Primárias da oposição devem definir eleições na Argentina

Primárias da oposição devem definir eleições na Argentina

Escolha entre governante de Buenos Aires e ex-ministra de Segurança pode definir futuro das eleições no país

 

Reprodução

Os candidatos Horacio Larreta, 57, e Patricia Bullrich, 67, disputam vaga da oposição de direita nas eleições à Presidência da Argentina

O que era para ser uma demonstração de união reforçou, por trás das câmeras, o clima frio que permeia a relação entre Horacio Larreta e Patricia Bullrich, adversários na disputa interna da oposição na Argentina. Ambos subiram ao palco no último domingo (30) para comemorar a vitória do único candidato local que apoiaram em conjunto. Já fora dos holofotes, mesmo a metros de distância, nunca se encontraram.

 

É essa a atmosfera da acirrada disputa na coalizão de direita Juntos por el Cambio, cujo resultado nas eleições primárias do próximo domingo (13) pode definir o futuro da corrida presidencial do país. Isso porque os dois postulantes têm diferenças essenciais: Larreta, chefe do governo de Buenos Aires, vende-se como "dialoguista" mais ao centro; já Bullrich, ex-ministra de Segurança, aposta na imagem linha-dura.

 

Dependendo de quem vencer, a corrida eleitoral deve ganhar novos contornos, tanto em termos de estratégia dos candidatos quanto em herança de votos remanescentes de um ou de outro lado. As outras duas principais forças já têm nomes praticamente certos para o primeiro turno em outubro, com o ministro da Economia Sergio Massa pelo peronismo e o deputado ultraliberal Javier Milei pela ultradireita.

 

Esta eleição é vista como uma das mais incertas dos últimos 20 anos, e as primárias, como uma espécie de grande pesquisa nacional. Até aqui, Larreta e Bullrich giram em torno de 15% das intenções de voto nas sondagens e, juntos, somam cerca de um terço do eleitorado, enquanto a peronista União pela Pátria segue colada atrás. Milei perdeu fôlego no último mês e registra de 12% a 20%, mas ainda tem chances.

 

 

Os dois adversários da direita têm perfis distintos. Ele é mais metódico e regrado, e ela, mais espontânea e impulsiva, descrevem integrantes da aliança do ex-presidente Mauricio Macri —que não declarou seu apoio, mas tem se insinuado mais a Bullrich. As características se refletem nas campanhas de cada um, opondo as ideias de uma mudança gradual e estruturada à outra imediata e profunda.

 

"Acredito em construir, não em explodir", "acredito em ouvir antes de falar", "acredito no respeito, não em insultar para obter alguma vantagem", repete Larreta em uma de suas propagandas, sempre colocando ênfase na experiência como gestor da capital federal nos últimos oito anos e usando o bordão "há os que falam e os que fazem".

 

O economista com mestrado em Harvard vem de uma linhagem de políticos e proprietários de terras. Teve seu primeiro cargo público de relevância no governo peronista de Carlos Menem, em 1995. Pouco antes, criou uma fundação para formar líderes políticos que depois seriam a base da força de Macri, de quem foi chefe de campanha e de gabinete, numa relação de mais de duas décadas.

 

Do outro lado, Bullrich enfatiza que vai "colocar ordem" no país e afirma que "um bom administrador ou um teórico de economia não é suficiente", sempre incitando a polarização. "Eu sei que nesse país soa melhor dizer que se vai solucionar negociando. Mas negociando com quem? E para quê?", diz ela em vídeo onde acusa o governo atual de fazer pactos com narcotraficantes, máfias e corruptos.

 

Cientista política, ela atuou como militante peronista contra a ditadura na década de 1970, quando se exilou no Rio de Janeiro. Foi deputada pelo menemismo nos anos 1990 e ficou conhecida por um corte nas aposentadorias como ministra de Fernando de la Rúa antes da grande crise de 2001. Exerceu mais dois mandatos como deputada e então se projetou como ministra de Segurança de Macri.

 

"Bullrich é uma personagem polêmica, mas volátil. Apesar dos fracassos, conseguiu se reinventar", diz a analista Camila Miele, da Universidade de Buenos Aires. Ela atrai, no geral, eleitores mais velhos e com maior renda, enquanto ele trais os mais pobres e mais jovens.

 

Além de saberem falar português, os concorrentes compartilham propostas punitivistas na segurança pública —como a construção de prisões de segurança máxima e a punição de infratores acima de 14 anos— e o liberalismo na economia como solução para o principal problema dos argentinos, uma inflação anual de 116%. Querem reduzir os gastos do Estado e derrubar as restrições à compra de dólares.

 

 

"Não temos que pensar que os votos de Larreta e Bullrich vão se somar no dia da eleição", afirma Nayet Kademián, cientista política da Universidade Nacional de San Martín. Se Larreta ganhar, é possível que os eleitores de Bullrich mais à direita migrem para Milei. Por isso, nesse caso, o chefe do governo de Buenos Aires deve adotar um discurso mais radicalizado, projeta a analista.

 

Já num cenário de vitória da ex-ministra, parte dos votantes de Larreta podem passar a Sergio Massa —que, apesar de ter sido escolhido pela vice-presidente de esquerda Cristina Kirchner, é mais centrista. Aí Bullrich também deve suavizar suas posições para atrair uma parcela mais moderada da população. As expectativas em torno dela cresceram nas últimas semanas, mas a disputa continua imprevisível.