Em briga de tucano, marreco morre na praia

Olá, Milton Ribeiro, Joaquim Silva e Luna e Sérgio Moro caíram na mesma semana.

Em briga de tucano, marreco morre na praia

Em briga de tucano, marreco morre na praia

 

Boletim Ponto

João Doria desistiu de desistir e Sergio Moro deixou a corrida presidencial - Luis Blanco/Governo de SP
Se nada der certo, Bolsonaro ainda pode tentar a carreira de ator

Olá, Milton Ribeiro, Joaquim Silva e Luna e Sérgio Moro caíram na mesma semana.

João Doria caiu, mas não caiu. E fica tudo como está no MEC, na Petrobras e na corrida presidencial.
 

.Nesse vai e vem. Eduardo Leite renunciou ao governo do Rio Grande do Sul para tentar derrubar João Doria e disputar a presidência pelo PSDB, prometendo uma unidade em que ninguém acreditou. Talvez por ciúmes, Doria também se movimentou para chamar a atenção, anunciando o abandono da candidatura para ficar no governo de São Paulo. A jogada pode ter sido inspirada em Jânio Quadros, mas Doria não foi tão longe para não correr o risco de alguém aceitar a desistência de sua candidatura. Em poucas horas, ele desistiu de desistir. Mesmo sem afinidade com o forró, Doria faz de tudo para ganhar no xenhenhém. Enquanto Sergio Moroabandonado pelo Podemos, deixou a corrida de verdade e, minúsculo, deve disputar uma cadeira na Câmara. Sem o ex-ministro de Bolsonaro no páreo, Doria ainda pode tentar juntar o que sobrou da terceira via numa aliança com o União Brasil e o MDB. Independente disso, a crise interna do PSDB não tem prazo para acabar. E, quem diria, quem pode ficar com o espólio é Lula. Depois de atrair Geraldo Alckmin, os petistas mantêm conversas com outras “cabeças brancas”, a ala mais antiga do partido, alijada por Doria e Aécio, e apostam que nos bastidores nomes como FHC, José Serra e Aloysio Nunes vão trabalhar para a campanha de Lula. Nada mais simbólico do que o encontro entre o coordenador do programa de Lula, Aloizio Mercadante e Pérsio Arida, ícone econômico dos tucanos. Soma pontos na aproximação o discurso de Lula para os empresários de que seu governo será previsível na economia, com segurança jurídica e sem revanchismo. E de quebra, o PT ainda volta a flertar com o PSD de Gilberto Kassab, que chega ao fim da janela partidária sem um candidato próprio à presidência.

.E o Oscar vai para... Se nada der certo, Bolsonaro ainda pode tentar a carreira de ator. Afinal, sua luta contra a escalada no preço dos combustíveis nunca passou de uma peça de ficção, com cenas memoráveis como a batalha do capitão contra a ganância dos governadores. Mas, acossado pela maioria da população que considera-o culpado pela alta da gasolina, Bolsonaro teve que vestir o figurino do intervencionista. É verdade que o mercado também cumpriu seu papel dramático, dizendo temer os arroubos e possíveis aventuras do capitão. O desfecho do drama merecia pelo menos um Kikito: Bolsonaro encenou o sacrifício do general Silva e Luna, mesmo indispondo o exército e a marinha, que caiu atirando contra a mudança da política de preços da Petrobras, enquanto o espectador era induzido a ver um capitão defensor do povo contra as mesquinharias do mercado. Mas a reviravolta era falsa. No lugar do militar, ascende à presidência da Petrobras Adriano Pires, que já defendeu até a privatização da estatal. Assumem novamente o protagonismo aqueles que nunca deixaram de estar lá, o mercado e o centrão, que agora não dependem mais da intermediação de generais para ter acesso ao comando da empresa. Sobra de pé apenas o arquirrival, Lula, denunciando que a única solução é o fim da política de paridade de preços do combustível no mercado internacional. Fora isso, são os remendos típicos de fim de novela. Sem solução à vista para o aumento de preços, ressuscita-se a proposta de criar um fundo de estabilização de preços que se arrasta desde o ano passado. E na disputa pelo prêmio de melhor coadjuvante, temos Paulo Guedes como homem humilde que diz que baixar impostos sobre a gasolina beneficia quem tem barcos e aviões e Sérgio Moro, no papel de aprendiz de neoliberal, dizendo que se fosse ele o presidente, privatizaria tudo de uma vez.

.Tapa na cara. Não durou uma semana a promessa de Bolsonaro de que colocaria a cara no fogo pelo pastor Milton Ribeiro. É verdade que Ribeiro contou com a solidariedade não apenas de Jair, mas da primeira-dama, dos ministros Tarcísio de Freitas e Damares. Sempre leal ao capitão, o pastor caiu para ajudar na reeleição e segurou a barra do chefe até no depoimento para a PF, mesmo com os rastros que levam diretamente ao gabinete de Bolsonaro no Planalto, onde os dois pastores foram recebidos mais vezes que o general Mourão. Ainda assim, segundo o Datafolha, o escândalo aumentou a percepção de que há corrupção no governo, quando justamente a anticorrupção era bandeira do bolsonarismo para se reaproximar da classe média morista. Os escândalos desagradaram também a ala evangélica que trabalha pesado para a reeleição. A reclamação é de que o caso manchou a imagem dos evangélicos em geral, além do fato de que Ribeiro só agilizava os pleitos de dois pastores da Assembleia de Deus, enquanto parlamentares da bancada evangélica e de outras igrejas ficavam na fila. Depois de tanta desmoralização, os pastores desistiram de disputar um sucessor e a vaga ficou temporariamente com Victor Godoy, um servidor de carreira, com mais proximidade com a área econômica do que com a educação. No entanto, a saída de Ribeiro não encerra o assunto para a oposição, que tenta abrir uma CPI, enquanto o MP começa a investigar os desdobramentos do caso. O troca-troca também não muda o essencial: o projeto de destruição do MEC e seu controle ideológico. Enquanto os evangélicos miram no controle do Conselho Nacional de Educação, o desmantelado INEP recomenda utilizar questões antigas no Enem por falta de novos testes prontos. Resta saber se o tema da educação vai motivar a juventude que embalou a campanha para tirar o título de eleitor para engrossar também as novas mobilizações pelo Fora Bolsonaro convocadas para 9 de abril.

.O futuro é um bolso vazio. Infelizmente a inflação não é uma peça de ficção. Este ano, o IPCA para o mês de março foi o maior desde 2015, sendo puxado pelos alimentos e pelo transporte. A única coisa que o governo conseguiu democratizar nos últimos anos foi a fome. Segundo a pesquisa DataFolha, ao menos 24% da população reconhece que a quantidade de comida em casa não foi suficiente nos últimos meses, situação que atinge não só os mais pobres mas também aqueles com renda superior a cinco salários mínimos. Sinal de que o cinto está apertando é que 70% dos endividados com cartão de crédito o fizeram para comer. Além dos alimentos e dos combustíveis, a inflação chegou a outro artigo de primeira necessidade, os remédios, que terão um reajuste de 11%. O efeito de tudo isso é a redução do poder de compra dos salários. Dados compilados pelo IBGE apontam que a renda média do brasileiro ficou em R$ 2.444 por mês entre setembro e novembro de 2021, o pior índice já registrado pelo Instituto. Com tudo isso, o bolso vazio pode se tornar o principal fator eleitoral deste ano. O economista Paulo Kliass alerta que a esquerda está sendo tímida ao tratar da crise social em andamento. Para ele, o cenário atual é favorável a uma iniciativa de massas similar ao movimento contra a carestia que ocorreu no final da ditadura. Aliás, Bolsonaro já percebeu isto, mas não tem nada a oferecer. Até mesmo para beneficiar os policiais o governo é cauteloso, temendo uma escalada de reivindicações por parte do funcionalismo público, que já se intensifica com a greve dos servidores do Banco Central. Já no setor privado, os entregadores e motoristas de aplicativos também convocaram uma greve geral. Só resta mesmo a Bolsonaro repetir a mesma ladainha de que a inflação foi causada pelas restrições impostas pelos governadores durante a pandemia. Haja paciência!

.Ataque dos cães. Sem ter nenhuma resposta concreta para a inflação ou a crise econômica, somado ao fracasso do Auxílio Brasil, Bolsonaro mais uma vez vai apostar no abstrato para a reeleição. O seu discurso no ato de filiação ao PL repetiu a pregação da luta do “bem contra o mal”, a historinha da facada e as ameaças golpistas, repetindo o bordão de “é duro jogar nas quatro linhas da Constituição”. Ainda assim, foi preciso pagar a militância para encher o auditório em Brasília. Voltaram também os ataques ao STF e também ao TSE, mesmo depois deste Tribunal e o PL terem dado um tiro no pé e ressuscitarem o “Fora Bolsonaro” quando tentaram censurar um festival musical. E se tudo der errado, sempre resta uma dor de barriga no meio do caminho para tirar o capitão da pressão da imprensa. Apesar da tosquice, Bolsonaro não é carta fora do baralho. Com a janela partidária, a base parlamentar do bolsonarismo alcançou 171 deputados, o Republicanos foi pacificado e enquadrado na base aliadaa máquina do Estado continua funcionando sem parar a serviço da reeleição e o capitão costura um bloco de candidaturas no sul e sudeste para fazer frente ao domínio lulista no nordeste. Muito mais grave são os movimentos para manter as forças armadas atreladas à sua candidaturadesde mais bônus aos militares até a escolha de Braga Netto como candidato à vice. Ainda que, lembra Pedro Fernando Nery, a principal ação do governo sob comando do general não tenha passado de um powerpoint

 

 


Ponto é editado por Lauro Allan Almeida Duvoisin e Miguel Enrique Stédile.

Edição: Vivian Virissimo