Militares brasileiros com o mesmo cacoete de 60 anos atrás – Por João Vicente Goulart
Senhores generais, respeitem o povo brasileiro e sua inteligência, respeitem a Constituição, pois o povo já conhece o velho e surrado argumento do “perigo comunista”
Militares brasileiros com o mesmo cacoete de 60 anos atrás – Por João Vicente Goulart
Senhores generais, respeitem o povo brasileiro e sua inteligência, respeitem a Constituição, pois o povo já conhece o velho e surrado argumento do “perigo comunista”
Segundo informações fidedignas da imprensa brasileira, a nota dos militares encabeçada pelo ministro da Defesa Braga Netto e endossada pelos três comandantes militares, do Exército, Marinha e Aeronáutica, foi discutida, engendrada e parida no seio orgânico do Palácio do Planalto.
O encontro ocorreu um dia antes da nota, que iria ser emitida com críticas ao senador Omar Aziz, que preside a CPI da Covid, e que bravamente a conduz com legitimidade, coragem e desprendimento, como forma de informar à nação o desrespeito com os recursos públicos.
A reunião convocada com outra pauta, escondia o medo das ruas e, em vídeos das últimas manifestações anti-Bolsonaro iam, entre conchavos e conspirações, acertando o alinhamento dos comandantes das Forças Armadas com o rebelde expulso do Exército, capitão Bolsonaro, que vem repetindo sucessivamente, que dependendo do resultado eleitoral de 2022, não aceitará democrática e constitucionalmente o resultado soberano emanado das urnas com a vontade do povo brasileiro.
O vídeo exibido, pasmem, levanta os mesmos cacoetes usados em 1961 e em 1964, pregando que as manifestações que vêm ocorrendo são para implantar o fantasma do “comunismo” no Brasil.
Ora, usando palavras daqueles que defendiam e defendem a Ditadura, “as favas com os escrúpulos”, com o desrespeito da ordem constitucional, da ordem democrática, da lealdade com a legalidade.
Chegou a hora de nossos militares olharem pelo Brasil e não se posicionar com o mesmo cacoete de sessenta anos atrás, argumento vetusto, indigno, de ignorantes históricos, que não têm na memória o sofrimento do povo brasileiro durante 21 anos de Ditadura, autoritarismo e obscurantismo, que a prepotência legou à nação brasileira.
Estão defendendo um Jânio Quadros de baixa patente, um louco que prega a tortura, que defende milícias, que não tem uma sequer atitude de compaixão com mais de meio milhão de mortos na pandemia, tampouco com os milhões de recuperados com sequelas.
Estão nossas Forças Armadas defendendo um golpe de Estado? Ou os senhores comandantes não conhecem a História?
Apoiando um possível golpe, ameaçado todos os dias por Bolsonaro que diz estar apoiado pelas Forças Armadas… É isso que é defesa da democracia?
Incentivando milícias fascistas, coisa em que as Forças Armadas não podem se transformar, esse incentivo ao aparelhamento de política sectária.
É interessante alguns trechos da nota do ministro da Defesa e seus comandados:
“As Forças Armadas não aceitarão, qualquer ataque leviano as instituições que defendem a democracia e a liberdade do povo brasileiro”.
A que democracia se referem, intrometendo-se em uma CPI, legalmente constituída sob a égide constitucional? Uma ameaça a democracia é o que a nota representa. Não sei se os senhores comandantes, do Exército, general Paulo Sergio, da Marinha, almirante Almir Santos, e da Força Aérea, Carlos Baptista Junior, conhecem esta parte de uma nota golpista de seus pares sessenta anos atrás:
“Na Presidência da República, em regime que atribui ampla autoridade de poder pessoal ao Chefe da Nação, o Sr. João Goulart constituir-se-á, sem dúvida, no mais evidente incentivo a todos aqueles que desejam ver o país mergulhado no caos, na anarquia, na luta civil. As próprias Forças Armadas, infiltradas e domesticadas, transformar-se-iam, como tem acontecido noutros países, em simples milícias comunistas.”
Esta é outra nota, de vossos pares em defesa da “democracia”, quando três ministros militares de Jânio Quadros, Almirante Sylvio Heck, da Marinha, Odylio Denys, da Guerra e o brigadeiro Gabriel Grum Moss, da Aeronáutica, queriam impedir a posse constitucional do vice-presidente eleito, através da força, da desestabilização democrática, como indicava a Constituição que haviam jurado defender.
Senhores militares, respeitem o povo brasileiro e sua inteligência, respeitem a Constituição, pois o povo já conhece o velho e surrado argumento do “perigo comunista”.
Sejam nacionalistas e defendam a seriedade democrática, a seriedade eleitoral, recuperem-se historicamente e dos 21 anos de desastre ditatorial que impuseram ao Basil.
Fiquem ao lado do povo.
João Vicente Goulart
Filósofo, poeta e escritor. Autor dos livros “Entre Anjos e Demônios, poemas do exílio” e “Jango e eu: memórias de um exílio sem volta”, este foi finalista do prêmio de literatura Jabuti na categoria Biografia. Preside o Instituto João Goulart desde 2004. É colunista da Revista Fórum.