Registro Histórico - Diálogo entre Rubens Paiva e Miguel Arraes na CPI IBAD/IPES, em agosto de 1963

Registro Histórico - Diálogo entre Rubens Paiva e Miguel Arraes na CPI IBAD/IPES, em agosto de 1963

 

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Registro Histórico - Diálogo entre Rubens Paiva e Miguel Arraes na CPI IBAD/IPES, em agosto de 1963

 


Corria, na Câmara Federal, a CPI do IBAD/IPES. O IBAD era o Instituto Brasileiro de Ação Democrática, uma organização anticomunista fundada em 1959 por Ivan Hasslocher . O IPES , fundado oficialmente em de fevereiro de 1962, no Rio de Janeiro, resultou da fusão de grupos de empresários anticomunistas do Rio e São Paulo que rapidamente ganhou a adesão das classes produtoras dos outros estados. As duas entidades conspiraram contra a Democracia e sabotagem o governo João Goulart. Em
23 de agosto de 1963, travou-se o diálogo a seguir entre o deputado Rubens Paiva e o governador de Pernambuco, Miguel Arraes.

O SR. Rubens Paiva – Muito obrigado, senhor governador. Dou a V.Exa. a tranquilidade de que a maioria desta Casa é composta de homens de espírito público que saberão levar em conta a inquietação de V.Exa. e de todo o nosso povo. Finalmente, senhor governador, desejo trazer a esta comissão um fato que me parece da mais alta gravidade e que me foi revelado por um deputado federal com assento nesta Casa, adversário de V.Exa., de que durante a campanha eleitoral V.Exa. utilizava um pequeno automóvel Volkswagen, e que os homens do Ibad, como já haviam feito no Rio de Janeiro, eliminando um determinado cidadão que contrariava as intenções dessa entidade, promoveram em Pernambuco, ao sentirem que seriam batidos nas urnas por V.Exa., uma reunião em que estavam presentes todos os dirigentes do Ibad e da Adep, sendo que nessa reunião ficou acertada, sob o protesto de um militar presente, que provavelmente será o coronel Carlos Astrogildo Corrêa, ficou acertada a eliminação física de V.Exa., através de um possível acidente de trânsito, no qual um grande caminhão abalroaria o Volkswagen que V.Exa. utilizaria. Tem V.Exa. conhecimento disso e poderá trazer algum esclarecimento sobre este fato estarrecedor?

O Sr. Miguel Arraes – Senhor deputado, tenho conhecimento dessa reunião, através de pessoa que diz ter tido acesso a ela, mas V.Exa. há de convir que não tomo conhecimento de ameaças que venho recebendo, também agora, no governo de Pernambuco, várias e repetidas ameaças anônimas, através de pessoas que vêm dizer que tais e tais elementos desejam a minha eliminação. Não tomo conhecimento, senhor deputado, desse tipo de ameaças. Essas ameaças visam, certamente, a tirar-me do caminho que me tracei na minha vida pública e dele não haverei de sair. Não serão ameaças que me impedirão de fazer o que fiz nesta comissão: vir depor, trazer documentos, denunciar e dizer a verdade. Mas sei, senhor deputado, que sou um homem marcado por aqueles que combatem os interesses do Brasil. Sou um homem marcado por esses que promoveram a corrupção. Sou um homem marcado, mas, senhor deputado, essa marca temerária, sob as cinzas das estrelas há de um dia se apagar, como dizia Joaquim Cardoso, o grande poeta de meu estado. Tenho esperança de que essa marca se apagará, através da luta de V.Exa., de todos os democratas e nacionalistas desta Casa. Vamos apagar essa marca, com a nossa luta e a nossa confiança no povo brasileiro.

NR - Com o golpe militar de 1964, Miguel Arraes foi deposto, preso e depois exilado. Voltou ao Brasil com a anistia e foi eleito deputado federal por diversos mandatos e governador de Pernambuco por mais duas vezes. Morreu de causas naturais em 2005.