Luiz Fux concede liminar para delimitar a atuação das Forças Armadas
Ministro ainda definiu que uso de forças militares para garantia da lei e da ordem só vale depois do esgotamento dos mecanismos ordinários
O ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal (STF), concedeu, nesta sexta-feira (12/6), liminar para definir que as Forças Armadas não têm atuação como poder moderador, sem que haja autorização para que intervenha no funcionamento dos Poderes da República. O ministro ainda estabeleceu que a prerrogativa do presidente da República de autorizar o emprego das Forças Armadas não pode ser exercida contra os próprios Poderes entre si.
Por fim, Fux definiu, na decisão, que o emprego das forças militares para a garantia da lei e da ordem só pode se dar depois do esgotamento dos mecanismos ordinários. A liminar concedida terá de ser referendada pelo plenário da Corte. Não há data para que isso aconteça. Por ora, vale a interpretação dada pelo relator da ação. Leia a íntegra da decisão.
“Em um Estado Democrático de Direito, nenhum agente estatal, inclusive o Presidente da República, dispõe de poderes extraconstitucionais ou anticonstitucionais, ainda que em momentos de crise, qualquer que seja a sua natureza. A Constituição bem tratou de definir os limites rígidos de atuação dos poderes estatais, seja em períodos de normalidade institucional, seja em períodos extraordinários. Destarte, todo e qualquer exercício de poder político deve encontrar validade na Constituição e nela se justificar”, apontou o ministro.
O ministro é relator de ação do PDT que pede a definição da atuação das Forças Armadas diante do uso de dispositivos legais por por apoiadores do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) — e até por ele próprio — em defesa da possibilidade de intervenção militar com base na parte final do artigo 142 da Constituição, que se refere à “garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem”.
O PDT pretende, com a ação, que o Supremo estabeleça – de uma vez por todas – interpretação conforme a Constituição de 1988 no sentido de que “o emprego das Forças Armadas na defesa da Pátria, na garantia dos poderes constitucionais e da lei e da ordem se limita aos casos e procedimentos da intervenção (CF, art. 34), do estado de defesa (CF, art. 136) e do estado de sítio (CF, art. 137)”.
O artigo 142 tem a seguinte redação: “As Forças Armadas, constituídas pela Marinha, pelo Exército e pela Aeronáutica, são instituições nacionais permanentes e regulares, organizadas com base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade suprema do Presidente da República, e destinam-se à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem.”
Fux, então, explicita que a expressão autoridade suprema conferida ao presidente da República está relacionada à hierarquia e à disciplina que informam a conduta militar. “Entretanto, por óbvio, não se sobrepõe à separação e à harmonia entre os Poderes, cujo funcionamento livre e independente fundamenta a democracia constitucional, no âmbito da qual nenhuma autoridade está acima das demais ou fora do alcance da Constituição”, frisou o ministro.
O relator também ressalta que a leitura do dispositivo não comporta qualquer interpretação que admita o emprego das Forças Armadas para a defesa de um Poder contra o outro. “Nesse sentido, a atuação do Exército, da Marinha e da Aeronáutica para a ‘garantia dos poderes constitucionais’ refere-se à proteção de todos os três Poderes contra ameaças alheias a essa tripartição. Trata-se, portanto, do exercício da ‘defesa das instituições democráticas’ contra ameaças de golpe, sublevação armada ou movimentos desse tipo”, disse.
Fux afirma que considerar as Forças Armadas como um “poder moderador” significaria considerar o Poder Executivo um superpoder, acima dos demais. Isso imunizaria o Presidente da República de crimes de responsabilidade e esvaziaria o artigo 85 da Constituição, justamente o que define que atos configuram crime de responsabilidade por parte do presidente.
“Descabe a malversada interpretação de que essa segunda atribuição conferida às Forças Armadas pelo artigo 142 da Constituição permite que os militares promovam o ‘funcionamento dos Poderes constituídos’, podendo intervir nos demais Poderes ou na relação entre uns e outros. Confiar essa missão às Forças Armadas violaria a cláusula pétrea da separação de poderes, atribuindo-lhes, em último grau e na prática, inclusive o poder de resolver até mesmo conflitos interpretativos sobre normas da Constituição”, enfatizou.
Dessa forma, configuraria em atuação anticonstitucional, segundo o relator classificou, qualquer iniciativa de um dos Poderes de uso de mecanismos não previstos para obstar medidas de outro Poder, dentre os quais, o uso das Forças Armadas.