Divisão clandestina do Itamaraty na ditadura espionou mais de 17 mil brasileiros

Divisão clandestina do Itamaraty na ditadura espionou mais de 17 mil brasileiros
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Diario do Centro do Mundo

Pesquisadores revelaram que um órgão clandestino do Itamaraty monitorou mais de 17 mil pessoas durante a ditadura militar. O Centro de Informações do Exterior (Ciex) operou entre 1966 e 1986, espionando brasileiros e estrangeiros, com foco em exilados políticos. Os dados foram obtidos a partir de 8.330 telegramas secretos analisados por acadêmicos da FGV, USP e instituições internacionais. Com informações da colunista Malu Gaspar, do Globo.
Os documentos desmentem a ideia de que o Itamaraty se manteve neutro durante o regime militar. O Ciex nunca foi reconhecido oficialmente pelo Ministério das Relações Exteriores, e sua portaria de criação permanece secreta. O acervo Latin American Transnational Surveillance (Lats), lançado em 2024, disponibiliza as informações sistematizadas ao público.
A espionagem visava mapear conexões entre opositores e seus apoios no exterior. “Havia uma obsessão por identificar quem falava com quem, quem viajava e quem recebia dinheiro ou treinamento”, explicou Matias Spektor, professor da FGV. O Ciex usava infiltrados para obter informações detalhadas sobre reuniões e alianças políticas.
Líderes exilados como João Goulart, Leonel Brizola e Miguel Arraes foram alvos constantes. Em telegramas, o órgão relatava encontros, financiamentos e até aspectos da vida pessoal dos monitorados. Em 1968, ano do AI-5, o monitoramento foi intensificado, com 97 relatórios mensais produzidos.

A atuação do Ciex antecipou a cooperação entre as ditaduras sul-americanas antes mesmo da Operação Condor, firmada em 1975. O Brasil trocou informações com regimes autoritários do Uruguai, Chile e Argentina, repassando dados sobre opositores e asilados políticos.
O monitoramento se estendeu para além da América Latina, chegando a Europa e África. Os relatórios mostram que o Brasil forneceu inteligência para regimes aliados e monitorou parlamentares estrangeiros que apoiavam exilados. O Ciex foi desativado em 1986, já no governo civil de José Sarney.