Lula, Nicarágua e o cinismo da Folha
A Folha – que já imprimiu mais de um milhão de exemplares diários nos anos 1980 e hoje chega às bancas com menos de 70 mil jornais impressos – parece que não enxerga.
Lula, Nicarágua e o cinismo da Folha
Charge: Aroeira |
Por Altamiro Borges
A mídia hegemônica brasileira – que foi protagonista do golpe do impeachment contra Dilma Rousseff, que criou o clima para a prisão abusiva do ex-presidente Lula por 580 dias e que chocou o ovo da serpente que levou ao Palácio do Planalto o neofascista Jair Bolsonaro – prepara agora sua artilharia para as eleições presidenciais do próximo ano.
Até outro dia, na busca do candidato ideal da chamada “terceira via”, ela criticava o autoritarismo do “capetão” e fazia de tudo para invisibilizar a principal liderança das forças de esquerda no país. Mesmo com Lula disparado à frente de todas as pesquisas de intenção de voto, jornalões, revistonas e emissoras de rádio e TV evitavam entrevistá-lo e falar dele.
Mas não dá mais para escondê-lo. A recente turnê do líder petista à Europa – aplaudido de pé no Parlamento Europeu na Bélgica, recebido pelo futuro chanceler da Alemanha, tratado com honras de chefe de Estado pelo presidente da França e paparicado pelas principais autoridades da Espanha – parece que ascendeu o sinal de alerta da mídia monopolista.
Da invisibilidade ao ataque raivoso
Ela decidiu intensificar desde já o bombardeio contra Lula. O objetivo é fustigar ao máximo sua candidatura e, de quebra, enquadrar seu discurso, fazendo-o recuar em seu programa. Nesse esforço, todas as armadilhas serão acionadas. A desta semana teve como mote a entrevista ao jornal espanhol El País na qual ele defendeu a autodeterminação da Nicarágua.
A mídia colonizada, com seu complexo de vira-lata diante dos EUA, não para de destilar ódio contra Lula. Comentaristas de tevê e editoriais dos jornalões são utilizados para atacar o ex-presidente e a política externa soberana e de integração latino-americana das forças de esquerda. Mas a precipitação do ataque hidrófobo é até positiva, porque revela qual será o nível da cobertura da mídia monopolista no ano da sucessão presidencial. Isto é bom para espantar ilusões!
Cuba, Venezuela e China – bem ao gosto da CIA
Um dos veículos que merece atenção é a “Folha de São Paulo” – que até hoje ainda seduz muita gente progressista. Em editorial publicado nesta quarta-feira (24), o jornal mostrou que sempre teve o “rabo preso” com a cloaca burguesa e o império. Intitulado “democrata flexível”, o texto compara Lula com Jair Bolsonaro na defesa de regimes autoritários.
“Quem tem memória dos 13 anos de governo petista, e da trajetória de mais de quatro décadas do PT, não estranhou a argumentação escalafobética do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva para defender as ditaduras amigas da esquerda brasileira”. Além de atacar a Nicarágua, o editorial destilou ódio contra Cuba, Venezuela e China – bem ao gosto da CIA.
Ao final, o jornal esbanjou sua arrogância. “Não há, infelizmente, nenhuma evolução na retrógrada posição petista nesse terreno. O partido pensa e age como Lula – vide nota congratulando Ortega e o elogio da ex-presidente Dilma Rousseff à autocracia chinesa – e não vai mudar. Agrada-se assim à militância fiel e ideológica, correndo-se o risco de suscitar a repulsa dos demais eleitores. De maneira mais tosca, é o que faz Bolsonaro também”.
"Rabo preso" com o império e os golpistas
A Folha – que já imprimiu mais de um milhão de exemplares diários nos anos 1980 e hoje chega às bancas com menos de 70 mil jornais impressos – parece que não enxerga. Quem é ela para arrotar sobre democracia? Basta ler o livro “Cães de Guarda”, escrito por Beatriz Kushnir e editado pela Boitempo, para conhecer seu papel nefasto no golpe militar de 1964.
Durante a sanguinária ditadura, a famiglia Frias, dona do Grupo Folha, apoiou o setor linha dura dos generais, deu aval às torturas e assassinatos e inclusive serviu de porão para os agentes da repressão. Na época, o jornal Folha da Tarde ficou famoso como de maior “tiragem” no país pelo número de tiras empregados na sua redação.
Quem é a Folha para dar aulas de democracia após ser uma das protagonistas do golpe de impeachment de 2016 contra a presidenta Dilma Rousseff? Quem é ela para falar em Estado Democrático de Direito após acobertar os crimes de abuso de autoridade do ex-juiz Sergio Moro e seus jagunços, que levaram Lula à prisão por 580 dias. Se enxerga, Folha!