Eleições, até quando assim?, por João Vicente Goulart
Animadores de palco, palhaços, locutores, esportistas, milionários, donos de banco e do agronegócio fazem do Congresso Nacional o espelho da nação que não tem consciência.
Eleições, até quando assim?, por João Vicente Goulart
Animadores de palco, palhaços, locutores, esportistas, milionários, donos de banco e do agronegócio fazem do Congresso Nacional o espelho da nação que não tem consciência.
Por João Vicente Goulart
Estamos vendo nestas eleições, mais uma vez, que vivemos a fantasia de uma palheta artística, como uma obra de Salvador Dalí, que nos brinda pessoas que derretem, políticos que vão e voltam, urnas que se abrem e confundem realidades necessárias, com a imbecilidade de acreditar numa promessa, que transforma a própria consciência social em confusões abstratas de corrupção, ganância e uso do poder em benefício de grupos e empresas fantasmas que assombram, com o descrédito da população e da decepção de um Brasil incorrigível.
Decepções que não levam os anseios populares a compreender que o que vemos, é pois, um visual corriqueiro da vida, confundindo visões esperançosas de progresso com fatos, fome como imagens corriqueiras que não fragilizam nossas consciências, considerando como nojo estas lenientes atitudes humanas do dia a dia que nos acostumamos a ver.
Conforma-nos os direitos democráticos de pensar e falar, como se fossem direitos de existir, sem levar em conta que aqui estamos convivendo com nossos semelhantes.
Livres e protegidos por regras sociais, por direitos de uma justiça injusta, e por isso poderíamos considerar-nos seres sem equívocos, ou sermos individualistas e pensar que isso é fantástico, pois as tragédias humanas estão longe de nossa realidade.
Certos de nossa univocidade, e donos da verdade individual e egoísta, a crítica é cega, a pobreza e a fome corriqueiras, a paisagem da miséria que nos rodeia faz parte da vida e tudo que nos abraça e olhamos para fora da janela, nos faz sermos indiferentes passageiros da miséria, do sofrimento e da fome da humanidade.
Democracia? Eleições?
Temos que rever o conceito, temos que rever os métodos, temos que rever a representatividade, e até, por que não, rever a base da antiga Grécia no referente ao “poder do povo”, pois a distorção atual dos poderes implícitos no voto livre e soberano estão severamente comprometidos com a condução messiânica do fundamentalismo da fé, dos falsos profetas, das falsas igrejas, dos oradores de falácias, sem a dialética da Natureza, própria dos embusteiros que apoiam a tirania, a prepotência, totalitarismo e o fascismo.
Que dizer do excesso de dinheiro público nas campanhas setorizadas de grupos específicos do agronegócio, da vulnerabilidade do judiciário brasileiro, dos ditos políticos mercadores de negócios autodenominados “em nome do povo”, que não dispõem de nenhuma ética política ou conduta moral, a não ser fazer do Congresso Nacional um balcão de negócios de seus interesses pessoais e de seus corruptores eleitorais?
A sanha dos políticos antipátria não hesita em pôr a sustentabilidade de nossos ecossistemas e biomas nas mãos da multiplicação econômica do agronegócio e dos defensores internacionais dos combustíveis fósseis, da privatização do Estado e da liquidação do patrimônio público.
Vamos acordar os vira-latas de Nelson Rodrigues, que eles pensam que jamais despertarão.
Vamos debater nossas imperfeições democráticas, pois elas não mais se sustentam sem uma reforma eleitoral ampla.
Como podemos nos vangloriar de nosso sistema eleitoral como a segunda, ou terceira democracia do Mundo, se sequer podemos auditar uma urna?
Como podemos construir partidos que sejam debatidos prioritariamente na população ante uma eleição, sobre suas propostas para a nação, sobre sua legitimidade de propostas, sobre sua ideologia, sobre seus princípios sociais, sobre sua doutrina, se neste país se vota em pessoas, independentemente das suas filiações partidárias?
Eleições assim? Até quando este povo não pensará na democracia como algo que tem que ser exercido pelos partidos?
Animadores de palco, palhaços, locutores, esportistas, milionários, donos de banco e do agronegócio fazem do Congresso Nacional o espelho da nação que não tem consciência.
Até o “Cacareco”, um hipopótamo, foi eleito décadas atrás, quando o voto ainda era em cédulas de papel para nos mostrar a fragilidade de uma nação construída sem base política crítica e sem a construção ideológica que deve nascer dentro do debate dos partidos com suas respectivas consistências doutrinárias.
As cláusulas de barreiras eleitorais deveriam ser impostas, se é que devem existir, não pelo número de votos e sim pela clareza de princípios de seus programas e propostas partidárias.
Quantos partidos o leitor acha que compõem os políticos que vendem nossa soberania?
Quais as diferenças que ideologicamente o leitor acha que esses partidos têm em propostas para o Brasil?
Em que se diferenciam, a não ser no apoio ao governo de turno para ocupar cargos e locupletar-se das benesses do governo?
Até quando assim?
Temos que pensar o Brasil e para isto temos que exigir uma reforma eleitoral como primeiro passo de transformação…
2020 não será cara ou coroa.
Chega de eleições representativas, queremos não só eleger, queremos participar, queremos mudar.
João Vicente Goulart
Filósofo, poeta e escritor. Autor dos livros “Entre Anjos e Demônios, poemas do exílio” e “Jango e eu: memórias de um exílio sem volta”, este foi finalista do prêmio de literatura Jabuti na categoria Biografia. Preside o Instituto João Goulart desde 2004. É colunista da Revista Fórum