Boca e River querem lembrar suas vítimas da ditadura argentina

Em 1976, os colorados vaiaram a polícia militar, que tentou impedir que se respeitasse um minuto de silêncio a João Goulart, seu ex-jogador da base e presidente deposto pelo golpe.

Boca e River querem lembrar suas vítimas da ditadura argentina

Futebol contra a ditadura!

Boca e River querem lembrar suas vítimas da ditadura argentina

Frente à atual etapa de destruição capitalista, é de suma importância defender as torcidas organizadas, os times que se posicionam contra a ditadura mundial do imperialismo e buscar difundir cada vez mais estes conteúdos. 

Por: Redação do Diário Causa Operária

 

Nesta sexta-feira (19), os clubes argentinos, Boca Juniors e River Plate, anunciaram uma campanha em conjunto com a Secretaria de Direitos Humanos da Nação, buscando resgatar a memória de vítimas da ditadura militar da Argentina, que durou de 1976 a 1983.

“O objetivo é que tenham o contato com as respetivas instituições, com o objetivo de conhecer as suas histórias de vida e reivindicar o seu estatuto societário no quadro de uma política de memória, verdade e justiça”, diz parte do pronunciamento oficial traduzido.

Está atitude dos clubes teve um resultado extremamente positivo nas redes sociais, com muitos elogios por parte dos internautas, parabenizando a atitude extracampo.

Confira a nota na integra:

 

 

 

 

 

 

Aproveitando a deixa, vamos relembrar aqui, mesmo que brevemente, parte da luta dos clubes de futebol contra a ditadura no Brasil e também pela verdade dos fatos.

As ditaduras brasileira e argentina não perseguiram muitos jogadores e dirigentes futebolísticos, pois, como sabemos, estas se utilizaram do futebol para controle social em diversas ocasiões e esferas sociais. Na Argentina, um dos casos famosos foi o do corpo descoberto e entregue aos parentes, de Gustavo Olmedo, que tinha 19 anos quando foi morto com vários tiros nas costas por agentes da repressão.

Gustavo Olmedo  (Foto: reprodução)

Seu crime: distribuía panfletos considerados subversivos na faculdade de engenharia. Mas política e construção civil não eram a sua maior paixão. Gustavo começava a se firmar como atacante do modesto Santa Fé. O governo do general Jorge Videla, acabou com essa e outras promissoras carreiras. Um levantamento feito pela Comissão Nacional para o Desaparecimento de Pessoas aponta que, dos 30 mil mortos ou desaparecidos, 30% eram operários e 21%, estudantes. Não há uma estatística oficial para atletas, mas entre as vítimas estão cerca de 50 esportistas federados em diversas modalidades – o maior número entre todos os países da América do Sul. A imensa maioria dos corpos de esportistas, em torno de 90%, ainda está desaparecida.

Por questões de interesse financeiro, diversos dirigentes de clubes de futebol estiveram alinhados ideologicamente com o regime do golpe de 1964. Colocando os clubes a serviço do regime, representantes de Corinthians, Palmeiras, Portuguesa e São Paulo apoiaram presidentes de federações, e neste caso, tanto no Brasil quanto na Argentina, expressando as ligações dentro da burguesia.

Esta relação entre a alta cúpula da política e futebol, que resultou na reação posterior, pode ser vista também em outros ocasiões como quando os arenistas (ARENA) obrigaram a união de clubes para formar o Volta Redonda, um representante forte da cidade da Companhia Siderúrgica Nacional, que vivia uma luta de classes tremenda, com ocupações de fábricas e etc. E também o caso do prefeito biônico de São José dos Campos, comprou o estádio do São José, salvou o clube das dívidas e provocou uma mudança nos símbolos da equipe, que, não à toa, eram conhecidos como clubes de ‘áreas de segurança nacional’.

No Brasil, um jogador que iniciou um certo caos dentro do sistema da ditadura, foi Afonsinho, um grande símbolo desse momento, tanto por seu envolvimento com o movimento estudantil, quanto por sua imagem rebelde, com barbas e cabelos compridos. Lutando pelo direito ao passe livre, causou desconforto tanto pela militância dentro de uma sociedade censurada, quanto por desdobrar outras lutas, como a de Raul Plassmann, que se desligou do Cruzeiro e depois negociou seus direitos com o próprio clube. O momento mais marcante de Afonsinho aconteceu em seu retorno ao Botafogo, em 1971, pouco antes de iniciar efetivamente sua briga pelo desligamento do clube. ”Quando me apresentei ao time, tive problemas com o Zagallo. Diziam no clube que por causa da minha barba, do meu cabelo, eu estava parecendo músico do ‘Iê-iê-iê’, como o rock era chamado naquela época”, afirmou o próprio jogador.

Outra figura que se colocou contra a ditadura foi Paulo César Caju. O craque representava o envolvimento com o movimento negro, visto com preconceito por muitos e com ódio mortal pela ditadura.

Sócrates e Reinaldo apareciam com um discurso político bem mais contundente. “Até chegar a figura do Sócrates, não havia luta política, os jogadores lutavam mais pela classe. Quando eu estava na universidade, levava para a concentração textos para discutir política. Tanto que passei a ser conhecido como ‘Pasquim’ pelos meus companheiros. Mas não havia esse posicionamento dos jogadores”, disse o ex-jogador do Fla e do Flu, Zé Roberto em entrevista.

Em 1976, os colorados vaiaram a polícia militar, que tentou impedir que se respeitasse um minuto de silêncio a João Goulart, seu ex-jogador da base e presidente deposto pelo golpe.

Os corintianos levaram faixas apoiando a anistia em 1979. Em 1984, torcedores de Vasco e Fluminense abafaram o hino nacional com os gritos de ‘Diretas Já’ no final do Brasileirão e no final da Taça Guanabara também pediam o fim da ditadura. Já atleticanos e cruzeirenses gritaram em uníssono o nome de Tancredo em um clássico, às vésperas do dia da posse do primeiro presidente civil em 21 anos, que estava internado em estado grave.

Em março de 2019, grandes clubes argentinos uniram-se para repudiar o golpe de Estado que instaurou a ditadura militar no país em 1976. Já no Brasil, em abril também naquele ano, clubes repudiaram o regime de terror, lembrando da luta de jogadores e torcidas à época. A mais simbólica manifestação brasileira veio do Corinthians, um dos clubes de maior torcida do país, que nas comemorações de 2019, também lembrou o ídolo Sócrates, antes de disputar a semifinal do Campeonato Paulista contra o Santos. Uma estátua do ex-jogador com o punho cerrado, gesto que o marcou como opositor da ditadura nos anos 80, foi exposta na arquibancada da Arena Corinthians, acompanhada de uma mensagem célebre difundida pela Democracia Corinthiana: “Ganhar ou perder, mas sempre com democracia”. 

O Bahia destacou o processo de democratização vivido recentemente nos bastidores ao deixar sua mensagem contra a ditadura. “Na alegria ou na tristeza. Na saúde ou na doença. De Democracia a gente entende. Hoje e sempre: #NuncaMais.”  Já o Vasco se mostrou crítico à ditadura pelas redes sociais, ao compartilhar a música “O Bêbado e a Equilibrista”, parceria de João Bosco com o vascaíno Aldir Blanc considerada um hino de protesto contra a repressão ditatorial, o time cruzmaltino desejou que os versos sejam “só lembranças que nos recordem que a democracia deve ser sempre a nossa verdade e nunca mais uma esperança equilibrista”.

Os times e jogadores brasileiros tiveram participação importante na luta contra a ditadura. Porém, é sempre bom lembrar que a imprensa burguesa brasileira adora fazer intrigas falando que tudo na Argentina é mais progressista. Na verdade, toda a América Latina foi vítima de ditaduras monstruosas, criadas contra os levantes populares, que, novamente, por conta desta destruição neoliberal, estamos vendo nos dias atuais.

Frente à atual etapa de destruição capitalista, é de suma importância defender as torcidas organizadas, os times que se posicionam contra a ditadura mundial do imperialismo e buscar difundir cada vez mais estes conteúdos.