As baionetas caladas

Indisciplina é contagiosa.

As baionetas caladas

As baionetas caladas

CARLOS BRICKMANN

 

O general Pazuello estava errado ao dizer que um manda, outro obedece. A verdade é que, no Brasil, um manda e outros obedecem. Bolsonaro tem razão: é o “seu gordinho”, é o “seu Exército”, são os “seus obedientes”.

 

Há, claro, alguns problemas. O general Hamílton Mourão, vice-presidente da República, já dizia, antes mesmo que Pazuello ficasse livre de punições, que a indisciplina tinha de ser punida. Lembremos que Michel Temer, muito mais suave que Mourão, já mostrou que vice tem força, sim. Mourão está na reserva, mas é general e conhece a caserna: "Se nosso governo falhar, errar demais, não entregar o que promete, essa conta irá para as Forças Armadas”.

 

Indisciplina é contagiosa. Um general da ativa de duas estrelas vai a um comício, não acontece nada, um terceiro sargento da ativa, Luan Ferreira de Freitas Rocha, já se manifesta: numa live do deputado Major Vítor Hugo, que só pisca os olhos quando Bolsonaro o autoriza, reivindicou maior salário e convocou militares em geral a participar do movimento. Major Vitor Hugo, fidelíssimo, jamais tomaria essa iniciativa sem consultar seu chefe.

 

Um general discreto, como Sérgio Etchegoyen, ou que fez a campanha de Bolsonaro, como Paulo Chagas, ou que foram seus ministros, como Santos Cruz, reclamaram. É óbvio que Pazuello e o sargento seguem o presidente que acaba de mostrar quem manda. Mas, como dizia Napoleão Bonaparte, pode-se fazer tudo com as baionetas, menos sentar-se nelas.

 

O grande mudo

 

No Brasil, as Forças Armadas são conhecidas como O Grande Mudo: têm poder, mas não se manifestam. Isso é um problema: sempre houve quem se sentisse seguro sem saber o que as baionetas calavam. O marechal Deodoro era amigo de D. Pedro II, dizia dever-lhe favores. E o derrubou. O marechal Dutra foi ministro da Guerra durante a ditadura de Getúlio Vargas, de quem era íntimo colaborador. E o derrubou. Quem deu o xeque-mate em Jango Goulart foi seu amigo Amaury Kruel, comandante do 2º Exército. Sustentar governos dá uma tremenda coceira nos dedos que seguram um gatilho.